quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O Sadomasoquismo e o Fetichismo na teoria Lacaniana.


Introdução

Quem colocou o sadomasoquismo e o Fetichismo em destaque entre os psicanalistas foi Sigmund Freud, mas após a sua morte, sua teoria foi modificada, deturpada, adaptada e perdemos o referencial freudiano, teve até psicanalistas que tentaram continuar a aplicação de sua teoria, mas que fugiram de sua essência, exemplo disso foi após a sua visita ao Estados Unidos da América em 1909 e os nova-iorquinos Loewnstein, Kris e Hartmann adaptaram a teoria de Freud ao “American way of life”, já que lá o bem supremo é o sucesso pessoal, promoveram a noção do “Ego-Autônomo” livre de conflitos.

Pequeno Histórico

Jaques Lacan entrou na psicanálise em 1936 e a partir de 1949, formulou o conceito do “Estado do Espelho”, a matriz constitutiva do ego, e definiu o “registro do Imaginário” em relação direta ao que Freud chamava de narcisismo.

Em 1953, Lacan funda a “Sociedade Francesa de Psicanálise” e inicia um estudo profundo da obra de Freud e aproxima-se dos novos pensadores de sua época, como por exemplo Ferdinand Saussure (Suíço) que criou a “lingüística” e quem definiu o “significante” (Imagem da “coisa em si” em forma acústica) e o “Significado” (a coisa em si, conceito representado) e o antropólogo Claude Levi-Strauss com sua concepção estruturalistas, que foi inclusive, um dos participantes dos primeiros seminários de Lacan.

Na teoria lacaniana, teremos a incorporação dessas novas tendências da modernidade de seu tempo, desta forma, Lacan vai buscar uma estrutura para o aparelho psíquico e retomar a importância da linguagem, que para ele é o modo como se capta as necessidades do sujeito, o código e na análise, será uma terceira pessoa entre o analista e o analisando dando fundamental importância a fala e a escuta psicanalítica. O analista possibilita a aparição do desejo mostrando a verdade do analisando.

Mas foi Lacan quem voltou a estudar a fundo a teoria de Freud após sua morte e a partir da década de 50 fez Freud retornar ao seu lugar. Embora, Lacan dizia-se “Mais freudiano que o próprio Freud” na verdade ele criou uma teoria própria, certamente embasada na teoria freudiana, mas que muda completamente o modo de ser do terapeuta, dentro do que Freud preconizava, mas isso é outra história, o importante é localizarmos o BDSM e o fetichismo dentro dessa nova roupagem.

Teoria Lacaniana








Antes de entrarmos na estrutura psíquica, temos que explicar o que é significante e significado (ou signo) para Lacan. Significado é a coisa em si. Significante é algo que aparece em lugar da coisa em si. A estrutura perversa tem a ver com o significante. Vamos ao exemplo considerando um homem que tem o desejo de ser degradado, humilhado e escravo. No nosso exemplo o significante é o masoquismo, isto é, um homem escravo. Desta forma, se espera que o significado seja um homem submisso, servil e humilde. Se o significado é esse ser escravo, ótimo, mas o fato é que não é isso que temos normalmente, pois o homem é um ser livre, que busca ser amado, desejado e honrado, houve um recalque em seu desenvolvimento que separou o significante do significado. Mais fácil ainda é exemplificar o fetichismo, o significante para o pênis (signo) no fetichista é o fetiche (Significante). Desta forma, na nossa vida, o significante tem muito mais valor que o significado. Não importa se eu sou forte, honrado e formoso, o meu significante é de um ser submisso, que necessita ser punido fisicamente e deseja ser escravisado. O recalque foi a causa da não adequação entre significante e significado. Mas ainda não vimos como isso se da na psicogênese e é o que veremos no “Édipo para Lacan”.

A importância da definição de significante está diretamente relacionado com o “Falo” que para Lacan é o significante da falta. Falo é aquilo que produz a sensação de plenitude, de perfeição e que levará ao gozo, não no sentido orgânico (ejaculação) mas no sentido de prazer pleno. Se tomarmos o exemplo do sadomasoquismo, se o masoquista tem um(a) dominador(a) que o aceite, ele tem o falo e se ele tem o falo, ele tem o “Gozo” como sendo objeto do Outro. Uma pessoa que tem o “Gozo” é uma pessoa normal para Lacan. Para o sádico é o mesmo raciocínio. Se o sádico deseja ter uma pessoa para infligir dor, e encontra uma pessoa que aceite sofrer para esse sádico, ele terá o falo e gozará enquanto sádico. Caso alguém ocupe este lugar então, este alguém será o falo. O falo é o significante do desejo do outro. O falo é o próprio signo do desejado.

Mas temos outros dois conceitos fundamentais na teoria de Lacan para a compreensão exata do que estamos falando, que é o gozo e o desejo, que estão interligados, dizemos que se um sujeito realiza o “seu desejo” ele tem o “gozo”. O desejo é o que move, o gozo é a finalização, o fim do desejo.

Desejo esta relacionado com o narcisismo, isto é, naquilo que completa a pessoa, algo que está por vir, algo que falta, então eu sou o ser desejante e o que me falta é o objeto desejado. Na visão de Freud para o complexo de Édipo, o desejo do menino é a mãe, pois Freud diz que a mãe vai prover tudo que falta para o menino, mas para Lacan o desejo existe antes de nascer a criança (e aqui somente trataremos do caso do sexo masculino) o desejo da mãe, isto é, quando nasce o menino, quem é o ser desejante é a mãe. O menino vai ser o que falta para a mãe, vai ser o falo. Mas o falo para Lacan é o significante da falta, não é o signo em si, por exemplo, se pensarmos que o que falta na mulher é o pênis, a criança não é um pênis, mas é o falo, só que para Lacan a criança vai substituir a falta do pênis. Falta do pênis é o significante, falo é a falta do significante, então a criança é o falo.

Vamos dar outro exemplo para que todos entendam o significado de falo. Na teoria de Malanie Klein, a criança deseja o seio da mãe, então na criança existe uma falta, um desejo de algo. A pergunta que lhes faço é se o seio seria o falo para a criança? Resposta é não, pois o seio não é uma representação de “algo” (significante), ela é o próprio signo e não o significante. Desta forma, não é o falo, não é algo que aparece no lugar da falta.

Estrutura psíquica para Lacan

O aparelho psíquico será estruturado por três registros que Lacan vai definir como Imaginário, Simbólico e Real. Todos estão lidados como um nó, que Lacan denominou nó borromeano e se algum desses registros sair do nó (romper) desestrutura os outros, demonstrando a interdependência de cada um entre eles.

“Registro Real” é o próprio sujeito biológico determinado pela genética. A interdependência deste com os outros dois registros é que vai definir e representar o sujeito. “Registro Imaginário” (imagens, matéria prima a partir do qual se estrutura o ego) é a ilusão de autonomia de consciência que corresponde ao que Freud definia como narcisismo. Esse registro vai aparecer nos primeiros contatos com a mão, onde Lacan defino como primeiro tempo do Édipo e que corresponde ao que Freud vão denominar fase oral e fase anal.

“Registro Simbólico”, é o inconsciente condicionado pela linguagem, é a fase onde Freud localiza o “Complexo de Édipo” onde a criança, que aprendeu a se comunicar, vê seus desejos proibidos pela fala do pai: “isso não pode”. Veremos mais detalhes quando falarmos do segundo tempo do Édipo.

O Édipo para Lacan

Lacan vê três tempos distintos do Édipo, o primeiro tempo é a célula narcísica entre mãe e filhos, mas esse narcisismo é diferente do que foi para Freud.

Para Lacan, não é do bebe que tem o desejo, e sim da mãe. A mãe é que deseja ter um bebe que a complete como mulher, ou seja o que o fez querer ter o filho. Ela tem um desejo na mente dela e a criança que nasce tem que atender esse desejo, desta forma, a inter-relação narcísica vem de fora, vem do desejo da mãe. É aqui que vamos entender o sadomasoquismo, pois nessa fase da vida, em que todos nós passamos, vamos estar numa situação masoquista, isto é, nós como bebe, estamos sujeito ao desejo do outro, somos o objeto do desejo do outro. Se a criança pensa que é toda poderosa, que é o filho ideal e que pode tudo, está se iludindo, pois na verdade ela é o que a mãe quer que ele seja, ela é o ego do outro. Ambos tem um gozo, a mãe se completa, pois tem seu desejo realizado, ela tem o falo, desta forma, Lacan distingue o falo em si, a criança, do falo simbólico, a mãe. Ambos estão completos, ambos tem o falo. A criança tem o falo simbólico, que é a mãe e a mãe tem o falo propriamente dito e é aqui que difere de Freud, pois para Freud, o falo é a criança, mas desta forma, a criança não teria um falo? Errado, pois ela também necessita de um falo, ela necessita da mãe. A criança tem um gozo, pois é amada pelo que ela pensa que é, porque ela acha que realmente é tudo para a mãe, o falo da mão, e que mais ninguém irá interferir nessa célula perfeita e completa, a célula narcísica. O fato é que a criança é o objeto do desejo da mãe, e é aqui que vamos entender de onde resgatamos esse desejo do masoquista de ser um objeto do desejo do outro, um súdito incondicional que fará realizar todas os desejos ou frustrações do outro. Podemos concluir que o desejo de ser um objeto nas mãos de outro, tem como fonte de inspiração, essa fase de nosso desenvolvimento, no narcisismo. Freud estudava o narcisismo, mas colocando a criança como o ser que deseja e a mãe como suprindo o desejo do filho. Aqui vimos que é o inverso, a mãe deseja e o filho passa a ser o desejo da mãe e a criança faz o que a mãe deseja.


Neste caso, a mãe é o “Outro” que na teoria de Lacan representa o código, a lei, a linguagem que determina as necessidades. A criança será o que a mãe determinar, o desejo da criança será o desejo da mãe. Na fantasia masoquista, é justamente isso, o sujeito quer ser o objeto na mão do outro, ser o desejo do outro.

A mãe tem outra função nesta relação, além de ser o código, ela é o “outro” imaginário, o semelhante especular com o qual o menino vai se identificar e crê que esse outro é ele.

A perversão consiste em conceber como um menino, em relação com sua mãe, indentifica-se com o objeto imaginário desse desejo, enquanto que a própria mãe o simboliza no falo.

Isso significa que o menino somente será o falo enquanto a mãe o simboliza. Se a mãe não o desejar mais, por exemplo, se nasce um filho mongol, ele deixa de ser falo, deixa de ter desejos, já que como vimos o desejo dele é o desejo da mãe. A existência do desejo da criança depende diretamente do desejo da mãe. Ele é o súdito incondicional que fará realizar todas as suas frustrações. Ela goza do atributo de poder ser a lei do desejo. Nesta relação onde tem alguém frente ao desejo do outro, alguém está sujeito ao desejo do outro, ser objeto de seu desejo. Mas se esse alguém passa a atender o desejo do outro, esse outro está se iludindo, ele se equivale a mãe fálica, tem uma expansão narcísica, mas apenas converteu alguém a imagem e semelhança de seu ego. No amor é muito comum as pessoas se iludirem quanto a isso, imaginam que o ser que ama representa tudo que sonhou, pois o sujeito esta fazendo tudo que o outro deseja, mas está iludido, pois apenas converteu alguém a sua semelhança, ao seu ego. Neste ponto vale a pena colocarmos a dificuldade de um encontro entre masoquista e sádico e para tanto traremos um trecho de uma entrevista com Magno Machado Dias, psicólogo e discípulo de Lacan.

o sádico goza tanto mais quanto menos gozar o seviciado, pois o horror deve estar lá presente. Mesmo porque, se o seviciado começa a gozar muito, parece que o horror vai embora. Do que o sádico vai gozar se o horror acabou? É aí que começam a aparecer as supostas dissimetrias: sádico precisa seviciar o outro que não goza com isso para ele gozar com o horror pelo qual passa o outro diante das suas sevícias.


O masoquista não tem esta sorte do sádico. Por quê? Digamos que ele quer gozar com seu próprio sofrimento, com sua própria humilhação. Mas ele não gostaria que aquele que o faz sofrer, que o humilha, gozasse com isto. Se não, do mesmo modo que no processo sádico, perde-se a graça de estar sendo seviciado a frio. Se o outro goza, ele goza como sádico, então estraga a posição do masoquista. Esta seria a idéia que aparece
em Lacan, em Deleuze, como em outros autores. Ora, é uma posição um pouco mais difícil a do masoquista e é aí que Deleuze fala em contrato. Ele precisa fazer um contrato a frio com o outro, pois este não está gozando com isso e vai realizar as sevícias que realizar sobre o masoquista a partir do cumprimento de uma palavra: “Contratei com você, e só porque contratei vou massacrá-lo para você gozar, mas não tenho nada com isso, não sinto nada com isso, estou apenas seguindo o nosso trato, cumprindo a minha palavra”. Afinal de contas, como o masoquista poderia gozar se estivesse lidando com o não-sádico e não o convencesse a operar aquela situação sem interesse específico? Ele precisa oferecer um interesse secundário. Há um pagamento em jogo. Cumprir o contrato é uma forma de pagamento.

• P – Mas o masoquista não pode ter como parceiro um sádico, pois este não vai cumprir o contrato.
- “Me bate!” – “Não!”
• P – Ou então vai bater além. A questão do masoquista é muito bem recortada. Há que dizer tal palavra, que fazer tal gesto, que se vestir de tal maneira, e só se pode ir até certo ponto.

Mas isso é o cenário. Pode variar extremamente. Quero insistir no fato de que, se o masoquista precisa fazer contrato, é porque, por exigência interna de seu próprio processo de gozo, ele não pode esperar do outro que o sadismo esteja presente. Vamos modificar um pouco a coisa. Não é porque ele não goza se o outro gozar. Isto não é verdade. Basta ter um pouco de experiência para saber. Podíamos, por exemplo, trazer aqui e perguntar a essa tal autora que foi aí citada. É uma coisa de que tenho certeza. Criou-se esse modelito que é inteiramente literário e não tem a ver com a realidade dos comportamentos e dos gozos que podemos colher como depoimento ou como presença (dependendo da experiência de cada um). Por quê? Se o masoquista precisa de contrato, na medida em que não há garantias de que o outro vá gozar com isso, o sádico não precisa, pode impor isso ao outro, estando este disponível ou não. É o óbvio ululante que está no pensamento de Deleuze. Mas o que quero objetar é que isto não é conditio sine qua non do funcionamento nem do sadismo nem do masoquismo. ” “Registro Simbólico”, é o inconsciente condicionado pela linguagem, é a fase onde Freud localiza o “Complexo de Édipo” e é aqui que Lacan representa o segundo tempo do Édipo na sua teoria, isto é, quando temos a entrada do pai na cena narcísica. O pai intervém privando o menino de seu objeto de seu desejo e priva a mãe do objeto fálico. Ocorre a castração simbólica. A teoria da Castração é retomada em três momentos por Lacan. Lacan começa colocando a substituição do trauma – trauma que, para Freud, foi substituído pelo conceito propriamente dito de Castração e, mais especificamente, pelo de recalque. Lacan, neste momento, prefere ver, no nível do falante, o desmame como efeito do recalque e, onde se lia trauma, Lacan passa a ler desmame, efeito de recalque e associa o trauma à foraclusão, associa o trauma à eclosão da psicose, ou, como é dito por ele ali, textualmente, a reconversão do Narcisismo em objeto.

Então, a Castração provoca uma equivalência entre o Pai Imaginário e o Ego. Portanto, a Castração, para Lacan, é a equivalência entre o Pai Imaginário, o Pai-Ideal e o Ego. Em jargão lacaneano: falta simbólica + objeto imaginário. Esta é a posição de Lacan sobre a Castração em 1957.”

“Em 1964, … Lacan está preocupado, ali, em distinguir os efeitos da Verdrängung, recalque originário, dos efeitos da Verwerfung, foraclusão do Nome do Pai. Então, ele vai recorrer a Aristóteles, à “Lei das Quatro Causas”. Tiquê é o “encontro faltoso com o Real” e, este “encontro faltoso com o Real” é que teria a ver com aquilo que Freud, redenominando com o “trauma histérico” e o outro com o “trauma do nascimento”, tentou dar conta e não conseguiu, que é a própria categoria de trauma. Este “encontro faltoso com o Real” comparece sempre em lugar deslocado, diferente no nível da Verdrängung, do recalque originário, diferente da Verwerfung, da foraclusão do Nome do Pai, porque o Real, nesta última, comparece sempre no mesmo lugar. Então, quem faz com que esta repetição se dê, mas sempre em outro lugar, é o autômaton, que nada mais é do que a redefinição do automatismo de repetição e que tem, para Lacan, a estrutura da pulsão. A partir daí, Lacan vai-nos fornecer uma outra visão, que só será consolidada nos anos 70, que trata dos efeitos da Castração. A Castração seria efeito, neste momento de sua obra, do Édipo, que se passaria no 4o tempo da Estrutura, porque ela converteria a identificação viril, o Pai Simbólico, o Gozo Fálico vigente no Édipo no Pai Imaginário do Pai-Ideal, do Pai Imaginário. Aí seria colocada a grande questão clínica da Psicanálise, que é a questão do Real do Pai, que é um conceito fundamental na Clínica de Lacan”.

“Real do Pai não é Pai-Ideal, e não é Pai-Real, que é ou Privador na perversão, ou Severo na psicose. Real do Pai é a possibilidade ou não de fazer luto do Pai-Ideal, e esta possibilidade só existe na Neurose. Se o incesto é proibido, então o sujeito é interditado em relação ao incesto e, portanto, o sujeito é privado do incesto. Isto é Castração, para Lacan”.

Já na perversão, no sentido fetichista, ao desmentir (déni) este Pai-Ideal na sua forma histérica – porque o fetichista parte do objeto fobígeno e este objeto fobígeno se caracteriza pela evitação prévia da angústia, por ser “sentinela avançada” contra a Angústia, não admitindo, em momento algum, a evidência do Desejo insatisfeito, criando, então, uma Fantasia universal da Fantasia Sádica, para fazer deste fetiche a suposição de “satisfação” deste objeto. Assim, ele nem recorre à possibilidade de fazer luto do Pai-Ideal e de suas “inconveniências”, que são: a Angústia de Castração e o Desejo insatisfeito.”

Para complementar a psicogênese do fetiche, que significa que inconscientemente não existe castração, isto é, a renegação da castração, já que ele quando criança nega que a mãe não tem pênis e depois na adolescência ele no inconsciente, vai re-negar a falta do pênis, vamos tomar literalmente o texto de Bleichmar (1984) sobre como isso ocorre na psicogênese que é o mesmo raciocínio para entendermos o sadomasoquismo.

“Em sua constituição houve, então: a) um deslocamento, algo conectou-se associativamente com o genital e se estendeu a supervalorização a esse algo; b) a castração ficou renegada e afirmada, o eu está cindido. C) Relacionada com o anterior, produziu-se uma transformação – realização de desejos: o que era uma ausência – o falo – ficou transformado em presença, o fetiche. Realizou-se um desejo que não é a alucinação do falo…no caso do fetichismo, é a ausência vivida sobre a base de uma presença ilusória.”

Não vamos nos aprofundar em conceitos básico, pois não caberia neste resumo, mas é bom que o leitor esteja atento a relação entre renegação e clivagem e a diferença entre renegação com repressão.

No segundo tempo do Édipo de Lacan, a criança percebe que a mãe é castrada e pode buscar o falo no pai. Percebe que ela se submete ao pai. Nesta situação, todos estão castrados. Temos a representação do pai interditor. Teremos então:

1) Substituição do poder da mãe pela lei
2) Determinação que o menino deixa de ser falo e passa a ser falo simbólico

Temos a interdição do incesto (o amor do menino pela mãe) a lei que ordena a vida, que Lacan vai definir como “O Nome do Pai”, significante que inscreve na subjetividade do menino a função do pai simbólico e promove a instauração da lei, quando a criança percebe que ele não é só da mão, mas a mãe tem outro desejo, isto é, seu pai. Esta fase é a mais importante para nós, pois é aqui que Lacan vai situar a perversão.

Aqui surgem dúvidas a respeito do pai arbitrário e despótico, se ele vai ser o castrador. A resposta é não, pois não teremos a castração. Mãe e filho passam a ser escravos de seus desejos. A célula narcísica não se torna em ferida narcísica.

Voltando ao texto de Mendança: “Real do Pai não é Pai-Ideal, e não é Pai-Real, que é ou Privador na perversão, ou Severo na psicose.”

Finalmente entramos no terceiro tempo do Édipo em Lacan, na resolução do complexo de Édipo propriamente dito.

Aqui temos a identificação do pai ideal, mas esse pai que a criança toma conhecimento, tem dois papeis, um de ser o personagem que vai direcionar o menino para a vida, para a cultura, para a possibilidade de escolher sua parceira no futuro. O outro papel, é o personagem que é dono da mãe, que é o desejo da mãe, que é seu rival no amor da mãe, mas a aceitação do incesto. Tiramos a representação do falo da criança, isto é, a criança não é mais o que completa a mãe, pois a mãe quer ter o amor do pai. Aqui a perversão ocorre quando a criança desmente o pai ideal. Não admite o desejo insatisfeito e cria a fantasia universal da fantasia sádica.

Devemos observar que sexo é diferente de desejo. Sexo é imaginário anatômico e desejo é da ordem da fantasia. Para Lacan é gozo. Para Lacan, o sintoma de qualquer problema psíquico, passa pela indentificação de um gozo particularizado para o sujeito no inconsciente. O sintoma psíquico é a expressão do simbólico no real e que está relacionado com a vida pessoal dapessoa e não é fixo ou estereotipado. Desta forma, cada um tem um único sintoma e um sentido particular para cada sujeito. Não existe causa e efeito.

Conclusão

Vimos que a teoria da estrutura psíquica de Lacan nos remete diretamente as teorias de castração e do complexo de Édipo formulada de Freud e que Lacan amplia esse conceitos, tornando a mãe e o pai como determinantes na relação. Destacamos a situação da mãe constituindo-se nesse relação com o menino, já que o menino é o falo da mãe, logo ela se constitui e vimos que as origens das fantasias sadomasoquistas está nessa fase da vida, no narcisismo, na relação mãe e filho.

A psicogênese ocorre no recalque, que vai separar o significante e o significado quando não há adequação. Desta forma, não é diferente do que Freud nos apresenta em relação ao sadomasoquismo e do fetichismo. Mas Lacan nos traz algo novo, uma estrutura fixa, o nó borromeano, onde cada uma das representações tem sua função, o real, o imaginário e o simbólico. Como vimos, se no simbólico, o masoquismo e o fetichismo é o que representa o desejo para o Gozo, e se estiver de acordo com os outros registros, então não existe problema. Vimos que a psicogênese do masoquismo e do fetichismo esta no mesmo plano, isto é, a criança quando não aceita a diferença de sexo, e embora abordamos o menino, isso serve para a menina, ela se sente castrada e não reconhece a castração, existe o recalque separando o signo do significante e a pessoa ou desloca seu desejo para um fetiche e renega a castração quando adolescente ou retorna para a fase anterior do Édipo, mantendo a célula narcísica, ou assume a identidade da mãe, como a detentora da lei (sadismo) controladora e dona do desejo ou assume a posição masoquista do filho nesta fase, isto é, um objeto a serviço do desejo do outro, um súdito incondicional e goza como tal.

Bibliografia

BLEICHMAR, H., Introdução ao estudo das perversões, teoria do Édipo em Freud e Lacan, tradução Emilia de Oliveira Diehl, Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.

CESAROTO E SOUZA LEITE, O que é psicanálise, segunda visão, ed. Brasiliense, 1992.




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